o fôlego do santo, por ssru

S. João, eremita natural do Porto que viveu no século IX, é um corredor de fundo, tal como os tripeiros que o veneram, elegendo-o a santo padroeiro. Através dos tempos o povo tem dedicado forte devoção e grandes festas, mantendo-se ainda hoje viva a tradição das fogueiras de S. João de origem muito antiga, substituindo-se assim as festas pagãs do solstício. Os festejos na cidade são já seculares e a origem desta tradição cristã remonta a tempos milenares, mas apenas no século passado é que o dia 24 de Junho passou a feriado municipal proporcionando um dia de merecida folia a milhares de tripeiros e visitantes.

Apesar das mudanças e modernizações a que a celebração tem sido sujeita ainda é possível manter muita da tradição: no alho porro, nas barracas que vendem o manjerico, as tendas das fogaças, a sardinha assada e o vinho, as farturas e o algodão doce, as tendas das loiças e das cutelarias, os matraquilhos e os carroceis, os balões e o fogo de artifício.

Há alguns anos atrás as festas estavam limitadas ao centro da cidade, situando-se as Fontainhas no centro geográfico, marcando o percurso pela Rua de Alexandre Herculano, a Praça da Batalha, Rua de Santa Catarina, Passos Manuel, Formosa ou Sá da Bandeira e ainda Praça da Liberdade, Avenida dos Aliados, Praça da República, Praça de Lisboa, Rua dos Clérigos e 31 de Janeiro. Mas as Fontainhas perderam muito do seu encanto desde que lhe espetaram os pilares da ponte no seu seio, dando-lhe aquele aspecto suburbano. Hoje em dia as festas encontram-se espalhadas por toda a cidade, da Ribeira à Foz, na Boavista, em discotecas e em viagem de barco pelo Rio Douro.

Uma das expressões culturais mais apreciadas no S. João são as tradicionais rusgas (não são marchas), que consistem no desfile pelas ruas de grupos de foliões trajados a rigor, interpretando os melhores temas sanjoaninos. Dispensam os carros alegóricos e não requerem muita luz, para dar o ambiente certo. Apenas os arcos, os balões e um grande número de outros adereços, que fazem o encanto de milhares de visitantes. Este ano reuniram-se na Batalha e desceram a Rua de Passos Manuel até a Avenida dos Aliados onde foram recebidos por uma “cascata de contentores” da finada Feira do Livro.

Para um tripeiro não é fácil assistir a um cenário destes. A vergonha e a falta de dignidade mancham os melhores dias de folia, de que bem precisa para fazer frente a uma luta diária de privações. Ainda no ano passado a Avenida foi palco de um feliz bailarico antes e depois do fogo de artifício da Ribeira.

Os ataques aos valores culturais dos portuenses têm sido uma constante e este ano culminaram com uma Avenida dos Aliados a parecer um estaleiro em obras, encimada com um “fan park” (?), razão pela qual não se realizou a habitual cascata sanjoanina, ali aos pés de Garrett.

Ainda confuso, o verdadeiro tripeiro, resistente fundista, lê as notícias e fica sem saber o que pensar quando lhe anunciam que se pretende tornar o S. João numa marca a exportar. Estará tudo grosso ou já não há a mínima decência…

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