ou as divagações em noite de primavera, por ssru
Um dos últimos artigos publicados no JPN captou a nossa atenção de uma forma invulgar. Ao reflectirmos um pouco sobre o assunto, após uma acalorada discussão, decidimos por uma tomada de posição sobre a matéria, o que poderá ser considerado um desvio no nosso percurso editorial, ou talvez não!
O artigo da autoria da jornalista Mariana D’Orey refere-se a uma intervenção de rua, expressa no desenho de um pássaro branco, o tsuru, na forma gráfica de origami pintado, elaborado por um escultor de 29 anos, Ricardo Dias, que apresenta os seguintes argumentos:
(…) Se, à primeira vista, pode ser um “trabalho egocentrista”, depois “as pessoas podem retirar alguma conclusão, falar sobre ele”. “Vão-se questionar sobre quem o fez e por que é que o fez”, afirma, justificando a óptica da partilha da arte da rua.
Ainda assim lembra que a sua intervenção outside não têm uma “intenção política”. “O meu trabalho é poético. Não vincula uma ideologia reivindicativa ou reaccionária. É poético, é bonito, fala de uma lenda, a imagem é um pássaro… Onde é que ele intervém na sociedade?”, questiona. Mas a resposta vem célere:
“Intervém porque as pessoas questionam-se, dizem ‘este gajo é maluco [porque] meteu na cabeça que ia fazer mil pássaros’. Eu, aí, já estou a chocar a sociedade, há muitas pessoas que já falam do meu trabalho. Mas é sempre uma intervenção social”, justifica.(…)
Pois… a nossa posição sobre a matéria não pode ser assim tão leviana e frágil! O trabalho, como objecto estético é apreciável, tal como o seria se fosse de facto em papel, ou em folha de alumínio, ou outra coisa…
Sem grande tolerância dizemos que se trata, aposto nos locais em que se encontra, de lixo urbano, de poluição ambiental, de vandalismo de propriedade privada e pública.
Vejamos um exemplo: o dinheiro dos nossos impostos pagou (e muito bem) as obras de conservação de que o edifício da Reitoria carecia há muito tempo. Ainda fresquinho e o Ricardo foi lá pintar no portão, provavelmente sem pedir autorização (dahh!), o seu ‘objecto de arte’, numerado e tudo. Novamente, sem sabermos quando porque pode demorar alguns anos, o dinheiro dos nossos impostos vai voltar a ser gasto para reparar e pintar o portão onde o Ricardo diz ter feito uma intervenção “poética e bonita”.
Ó Ricardo, olha que também não é assim que pensam os proprietários dos prédios visados e os responsáveis pelos edifícios públicos em causa.
Queremos no entanto sugerir uma verdadeira intervenção poética, uma causa “à séria”, daquelas que até dá gosto:
propomos que o Ricardo e todos quantos quiserem, se juntem a nós (claro que iremos disfarçados) e abracemos uma limpeza urbana, por exemplo, da Rua de Cefofeita (tão desgraçadinha!), de toda a parte pedestre, o rés-do-chão de um lado e outro da rua, com os materiais e ferramentas certas que a CMP certamente nos emprestará (tal como fez na Ribeira) e só paramos quando aquilo explodir de tanto brilho. Os comerciantes de certeza que agradecerão, e pelo meio ainda nos servem umas cervejas e umas santochas de presunto para retemperar as forças.
Aí sim, até dava gosto sentar naquele chão de calcário, estourados de tanto esforço e com os olhos baços, apreciarmos uma verdadeira obra de arte urbana.
Conseguem já imaginar? Conseguem ver a Rua de Cedofeita limpinha e com o sol a aquecer as montras, sem cobertura nem nada…?