A Câmara Municipal do Porto institui em 1988 um prémio que tem como objectivo “incentivar e promover a recuperação do património arquitectónico” da cidade, visando distinguir o “melhor exemplo de reabilitação que tenha sido concluído, durante o período de dois anos a que cada prémio se refere”. No entanto só foi atribuído pela primeira vez em 1990 à recuperação do Edifício do Círculo Universitário do Porto, obra de Fernando Távora. De então para cá, foram galardoadas as obras do Edifício da Ordem dos Arquitectos (Helena Rente, José Carlos Portugal e Tiago Falcão), do Teatro Nacional de S. João (João Carreira), do Teatro Municipal Rivoli (Pedro Ramalho), da Ilha das Aldas (Pedro Mendes), do Edifício na Rua da Cerca, 5-7 (Barbosa & Guimarães, Lda.) e do Edifício na Avenida da Boavista, 1354 (António Portugal & Manuel Reis).
Desde o primeiro momento que o “Prémio João de Almada” tem angariado uma reputada importância no panorama municipal da reabilitação patrimonial, ao ponto de em várias edições as decisões de não premiar tenham sido tomadas com base no mérito das propostas, tendo na última edição, em 2008, o júri decidido não atribuir o prémio, optando por destacar três menções honrosas.
Na presente edição, a 13ª, o júri foi presidido pela Vereadora do Conhecimento e Coesão Social da CMP, Guilhermina Rego, e constituído por Jorge da Costa (em representação da Direcção Regional de Cultura do Norte), Alexandre Alves Costa (em representação da FAUP), Nuno Graça Moura (em representação da OA-SRN), Dulce Marques de Almeida (em representação da ARPPA – Associação Regional de Protecção do Património Cultural e Natural), Maria Susana Soares (em representação da Direcção Municipal de Urbanismo da CMP) e ainda por um representante da Direcção Municipal de Cultura da CMP. O júri já elaborou a proposta de decisão que foi ontem aprovada em reunião de câmara, tendo sido atribuído um primeiro prémio ao Palácio das Artes, projecto da autoria dos arquitectos Alfredo Ascensão e Paulo Henriques, bem como duas menções honrosas, uma para um edifício na Rua de S. Miguel e outra para a Escola Aurélia de Sousa.
O Jornal de Notícias da passada segunda-feira [JN 26-07-2010] revela que o júri destaca “o carácter e a dignidade da intervenção num edifício que tem uma história valiosa e que não é escondida, assumindo a reposição de uma identidade que se encontrava algo adulterada, fruto de sucessivas alterações ao longo do século XX”.
No fundo o que isto quer dizer é que é possível fazer bem feito e levar à prática a definição legal de “Reabilitação urbana”, que é: a forma de intervenção integrada sobre o tecido urbano existente, em que o património urbanístico e imobiliário é mantido, no todo ou em parte substancial, e modernizado através da realização de obras de remodelação ou beneficiação dos sistemas de infra -estruturas urbanas, dos equipamentos e dos espaços urbanos ou verdes de utilização colectiva e de obras de construção, reconstrução, ampliação, alteração, conservação ou demolição dos edifícios (no Decreto-Lei nº 307/2009, de 23 de Outubro – sublinhado nosso).
De entre os 21 candidatos, o júri reconheceu o “esforço da equipa projectista, que soube resistir a tentações de algum exibicionismo material”, e a “qualidade da operação de reabilitação perante o edifício pré-existente, deveras complicado, de pouca profundidade e com abundante material arqueológico”. Consideraram assim que a intervenção efectuada no Edifício Douro/Palácio das Artes é “um exemplo cuidadoso de valorização do património”. BRAVOS!
E como ‘não há bela sem senão’, encontramos ainda no mencionado artigo do JN, algo que nos deixou perturbados (mesmo recordando ainda a nossa primeira intervenção neste sítio), ao ponto de soltarmos uma gargalhada colectiva: (…): “Na lista, encontram-se, entre outras propostas, a reabilitação do quarteirão de Carlos Alberto pela Edifer com desenho do ateliê Miguel Saraiva e Associados” (…); isto com direito a uma referência despropositada ao empreiteiro responsável pela execução dos trabalhos, que no caso não interessa nada, uma vez que o prémio se divide entre o projectista e o dono da obra.
Ou seja, ser possível candidatar um conjunto edificado cuja intervenção violou o PDM da cidade, demolindo três edifícios na Rua de Sá de Noronha e esventrando outros dois na Praça de Carlos Alberto, que foram referenciados na Carta de Património pela mesma entidade ou serviço camarário que organiza o Prémio João de Almada, é algo que só passaria nas cabeças de certo tipo de pessoas, sem dúvida, gente digna da nossa maior comiseração. Sabemos que é algo que ambicionam ardentemente, até para legitimar uma espécie de intervenção e uma certa (des)orientação neste mundo tão desconhecido da ‘reabilitação patrimonial’.
Giro, giro, era terem ganho qualquer coisita… isso sim!!!