Afinal, o que é uma ruína? A questão até parece idiota, mas pelos vistos, não!
Da definição em dicionário podemos obter: s.f. 1 acto ou efeito de ruir; desmoronamento; 2 restos ou destroços de uma construção danificada; 3 (fig.) decadência; 4 (fig.) falência.
A primeira imagem que assalta o nosso cérebro é a de um edifício ou construção em adiantadíssimo estado de degradação, onde a maior parte dos sistemas que o compõem colapsou. Também nos lembramos com frequência dos vestígios arqueológicos que os povos primitivos nos deixaram como marca da sua passagem.
O mês passado no Jornal de Notícias aparecia um artigo que referia a existência de 653 prédios em mau estado ou ruina na Zona Histórica, muitos deles ainda habitados. Os números não são inventados, foram recolhidos do anteriormente apresentado (com pompa e circunstância) “Plano de Gestão do Centro Histórico do Porto”.
A notícia jornalística procurou um maior impacte e juntou o número de edifícios em mau estado, com os assinalados como ruína, ou seja, 575 + 78 edifícios, respectivamente, o que não deixa de ser verdade, julgando correctos os números apresentados.
No dia seguinte o diário gratuito, Jornal Metro, fez eco [metro2009-01-12_porto] das declarações do Sr. Vereador do Urbanismo à Agência Lusa, onde aquele garantia que “ninguém tem de recear andar pelas ruas do CHP”.
Em nossa opinião este é um discurso ruinoso (em sentido figurado, claro está!) uma vez que não contribui para a credibilização do estudo apresentado e com o qual nós, Cidade, nos comprometemos perante a UNESCO. Por outro lado sabemos bem que não é assim e que ‘quase’ todos os dias cai qualquer coisa dos edifícios do Centro Histórico e até da Baixa: ou uma telha, um vidro, uma porção de reboco de parede, um elemento de uma guarda ou de uma varanda, uma janela ou um aro de porta. É que não é preciso cair uma sólida parede de granito para criar problemas a quem passa, embora já tivessémos visto uma cornija de granito esmagar um automóvel há uns anos atrás. Morar e trabalhar por aqui permite-nos estes ‘luxos’.
Mais ainda, o discurso do Sr. Vereador (que se calhar nem dá por isso) também peca por transmitir um sinal contrário aos responsáveis pelo estado de degradação dos edifícios, começando pelos seus proprietários, impedindo uma tomada de consciência da verdadeira amplitude do problema. É portanto, um discurso falido, do qual ninguém beneficia, incluindo o executivo camarário. Por vezes dá jeito que seja assim, depois parece melhor ser da forma contrária, conforme as necessidades do discurso político.
Pelos vistos, neste momento pré-eleitoral, interessará que já seja visível a reabilitação da Baixa do Porto.
Ò Sr. Vereador, nós também acreditamos que o Plano terá algumas imprecisões, alguma manipulação dos números, mas não deixa de ser um instrumento de trabalho (para já mais um, tão vago como muitos outros anteriores) no qual devemos confiar minimamente, até porque se encontra lá investido dinheiro dos contribuintes e muitas horas de trabalho.
Mas vamos aos exemplos daquilo que nos trás aqui e julgamos que apenas estes três bastarão, uma vez que são tão diferentes entre si. O primeiro, que se reporta às fotos acima, são dois edifícios vizinhos daquele que, há dias, ardeu na Rua de Trás, onde 4 vidas se perderam, penosamente, sem que até agora se note qualquer consequência em matéria de responsabilidade civil, criminal ou política. O estado aparente destes edifícios é tal que deveriam ser classificados como ruínas, embora apareçam no Plano apenas em mau estado (o que também é verdadeiro, mas não chega).
Este segundo exemplo refere-se a um excelente edifício na Rua de Mouzinho da Silveira, local onde outrora funcionou uma agência bancária e agora se comercializam artigos religiosos. A primeira foto foi retirada do livro “CRUARB 25 anos de Reabilitação Urbana”, edição da CMP e datada de 2000. Tanto no Documento Estratégico da Porto Vivo como no Plano de Gestão este esbelto prédio está classificado em Bom estado de conservação. No entanto, já em 2000 se notava que o canto superior esquerdo do arranjo estético do rés-do-chão estava a precisar de manutenção. Há dias caiu sem fazer vítimas e escusado será dizer que ‘todos os santos ajudaram’.
Por fim, também na Rua de Mouzinho encontramos um edifício da Porto Vivo, que esta anunciou há uns anos atrás que iria reabilitar através de uma parceria com um construtor, mas até hoje, infelizmente, nada aconteceu a não ser o agravamento da situação. Olhem bem, isto parece-nos uma ruína (na sua mais directa definição) embora outros possam julgar estarmos perante um edifício em mau estado.
O que fazer então sobre esta matéria… Vamos continuar a brincar aos carimbos e às classificações (à espera que morra mais alguém), em vez de pormos mãos à obra? Não seria mais prudente declarar uma espécie de ‘estado de emergência’ e intervir já nestes casos?